SAFE — Novo Instrumento de Investimento em Startups
- Daniela Agostini
- 30 de mai. de 2021
- 6 min de leitura
Você já ouviu falar do SAFE?
A lendária aceleradora do Vale do Silício Y Combinator introduziu esse instrumento no mercado no final de 2013, e desde então tem sido utilizado por quase todas as startups da aceleradora e por inúmeras outras startups no mundo como o principal instrumento de suas primeiras rodadas de investimentos. É chamado mundialmente de SAFE: “Simple Agreement for Future Equity”, em tradução livre, “Acordo Simples para Participação Futura”.
Esse instrumento é muito conhecido internacionalmente, porém é novidade em captações no Brasil. Quer conhecer melhor como ele funciona? Confira abaixo.

Principais Características
Valuation da empresa não definido
Na fase inicial de uma empresa, é difícil atribuir com precisão seu valor (Valuation) via metodologias tradicionais como fluxo de caixa descontado e múltiplos de mercado, muito porque geralmente existem poucos dados sobre esse tipo de empresa e o setor em que ela atua. É aí que um SAFE entra em jogo — é um instrumento de investimento que permite adiar a parte da avaliação do valor da empresa para o futuro, quando haverá mais informações e histórico do negócio disponíveis.
Participação definida na rodada futura de Série A
Toda startup busca crescer e se destacar no mercado em que atua. Nos seus anos iniciais, uma das opções para seguir neste caminho é realizar uma captação série A (será explicada em mais detalhes nas próximas seções).
Desconto no Valuation futuro
Esse tipo de instrumento beneficia e protege o investidor que entra na rodada, pois quando o valor da empresa for determinado, o investidor terá um desconto neste valuation futuro.
Como é classificada esse instrumento de investimento?
Assim como outros instrumentos de investimento em startups temos um contrato de “Mútuo Conversível”, que nada mais é do que um empréstimo em que o mutuário (investidor) tem a opção de, futuramente, converter o capital aportado em cotas de participação da empresa. Porém, diferente do modelo de “mútuo conversível tradicional”, o valuation e participação ofertada no “mútuo conversível SAFE” não é definido na rodada, e sim no futuro.
Por que as empresas utilizam esse modelo?
O modelo de SAFE existe para dar maior proteção aos investidores, pois o valuation da empresa só será definido em um momento futuro, em que a empresa estará mais madura e terá se provado no mercado (estágio mais fácil de ser quantificado). Esse momento futuro será quando outros investidores e players do mercado irão avaliar quanto a empresa vale.
Fazendo um paralelo para facilitar o entendimento:
Imagine que você é dono de uma galeria de artes e identificou um jovem e promissor pintor no mercado (empresa XYZ) e o convidou para expor suas obras em sua galeria. Seu intuito é investir nos quadros e ter a saída (venda do quadro) em 24 meses, pois seu comprador potencial seria grandes museus mundiais.
Porém, mesmo que o artista seja muito promissor por sua técnica inovadora, vendeu poucos quadros até o momento e ainda não tem muita visibilidade nesse mercado. Nesse caso, você teria duas opções:
1. Pagar um valor fechado pelo quadro agora, porém sem ter muita informação sobre esse artista; ou
2. Pagar 20%/25% a menos do que o museu de Londres pagará no futuro. Se o valor for muito alto, você pagará um limite predeterminado, e se o valor for baixo, pagará um valor mínimo também predeterminado.
A segunda opção parece ser mais interessante, não é? Ela é exatamente o SAFE.
Esse limite predeterminado (chamado de “Valuation Cap”) e desconto no Valuation são os dois principais fatores que tornam o SAFE atrativo para o investidor que entra em rodadas iniciais de investimento. Quanto maior o desconto, e menor o limite de valuation (“Valuation Cap”), maior será a possibilidade de retorno para o investidor.
O SAFE é um pouco mais complexo do que outros já utilizados no mercado brasileiro, porém é o mais utilizado em investimentos de startups globalmente, dado que traz muito mais proteção aos investidores e deixa a discussão de Valuation para rodadas futuras com maior valor envolvido, e quando a empresa estará em um estágio mais avançado e quantificável.
Quando ocorre a conversão do mútuo em cotas da empresa?
Há dois eventos que disparam a conversão do mútuo em cotas, sendo obrigatória a conversão (para o que ocorrer primeiro):
A primeira é a conversão após uma nova rodada de investimento série A.
Nesta fase, a empresa já definiu seu modelo de negócios e seu mercado, produtos/serviços e consumidores são conhecidos. Geralmente o objetivo das empresas nesta fase é impulsionar a escala de produção, otimizar distribuição, bem como expandir a atuação no mercado. Os valores de investimento em uma Série A no Brasil costumam ser superiores a R$ 5 milhões. Fundos Venture Capital e Private Equity são investidores que, geralmente, participam dessas rodadas e investem em startups nesse estágio, mas também é possível encontrar investidores pessoa física ou grupos de investidores anjo investindo esses valores.

Porém não será qualquer rodada série A que poderá disparar o gatilho do SAFE. Cada empresa que utiliza essa modalidade define alguns requisitos, sendo dois parâmetros mais utilizados: valor do aporte (quanto que será investido na rodada) e Valuation Pré Money (avaliação da empresa antes do valor aportado na rodada).
A segunda forma é no vencimento do contrato de mútuo (normalmente 24 meses).
Outro evento que pode disparar a conversão do investimento é a aquisição de mais de 50% da empresa por algum fundo/player do mercado, porém ela é menos comum.
E se a empresa não fizer nenhuma rodada que atenda aos requisitos definidos?
Caso a empresa tenha sucesso em executar seu planejamento estratégico sem a necessidade de uma rodada de investimento série A, o “SAFE” da empresa prevê, nesse caso, uma quantidade fixa de cotas para os investidores, protegendo o investidor em qualquer possível cenário.
Qual é o prazo médio de vencimento do SAFE?
O prazo médio de vencimento do contrato é de 24 meses, podendo ser prorrogado por mais 12 meses, quando em comum acordo entre as partes.
Se o investidor decidir não prorrogar o prazo por mais 12 meses, poderá escolher entre a devolução do mútuo corrigido a um percentual ou a conversão em cotas da empresa, sendo a decisão sempre dele.
Abaixo fazemos uma comparação entre o modelo tradicional e o modelo SAFE, respectivamente:

Quais são as possibilidades de retorno do investidor nesse instrumento?
O retorno do investidor está totalmente atrelado aos próximos eventos de liquidez da empresa, que irão determinar o valuation da empresa, e consequentemente sua participação. Os principais eventos que possibilitam retorno são:

Obs: Como a conversão do investimento acontecerá no futuro, normalmente o contrato do “SAFE” prevê uma taxa de correção do valor até o vencimento.
Quais são os riscos?
Assim como qualquer investimento em startups, o risco real que o investidor está exposto é a perda integral do valor investido, se a empresa não atingir a eficiência operacional desejada ou deixar de existir após o investimento. É um investimento de alto risco, já que não há como garantir que qualquer startup irá prosperar ou atingir os objetivos traçados. Dado a estrutura jurídica do mútuo conversível (que é considerado um empréstimo no momento do investimento), não há riscos adicionais de sucessão (trabalhistas, fiscais, ambientais, etc) e por isso não há aportes futuros obrigatórios em caso de encerramento das atividades.

O que é necessário prestar atenção nesse tipo de instrumento?
O SAFE é um instrumento mais complexo do que outras modalidades de investimento em startups. Por exemplo, diferentes empresas que oferecem SAFEs utilizam termos distintos para descrever a “rodada série A” — e outros parâmetros relativos à conversão. Por conta disso, abaixo listamos os principais pontos que devem ser analisados com atenção nessa modalidade:
Gatilho da Conversão: Normalmente as empresas utilizam o gatilho de uma nova rodada (com Valuation Pré Money e Valor de Aporte pré definidos) para a conversão do investimento, mas outro gatilho pode ser a aquisição de mais de 50% da empresa por algum fundo/player do mercado. É preciso estar atento ao mecanismo de conversão, e se ele está aderente com o mercado e empresa que você busca investir.
Valuation Cap: Um dos termos mais importantes nessa modalidade. Representa o preço máximo que o investidor irá pagar na conversão do título. Exemplo: Se investir numa rodada com um limite de Valuation de R$ 8 milhões, e mais tarde for avaliada em R$20 milhões, a participação que o investidor obterá será com base no Valuation de R$8 milhões, não o de R$20 milhões. Nesse caso, quanto maior for a avaliação da empresa no momento da venda, maior será a chance de aumentar o retorno do investidor.
Participação máxima e mínima a ser oferecida na rodada: Importante entender qual é o intervalo (valor máximo e o mínimo) que essa rodada poderá representar em participação. O valor final dependerá do valuation definido em uma próxima rodada.
Prazo do contrato: Normalmente o período do SAFE é mais curto que os mútuos conversíveis tradicionais, sendo 24 meses o prazo mais comum, enquanto os mútuos conversíveis podem chegar em até cinco anos.
Desconto no Valuation Futuro: Nas fases iniciais de startups, os valores praticados internacionalmente de desconto no Valuation futuro estão entre 5 a 25%.
Texto por: https://medium.com/smu-investimentos/safe-nova-modalidade-de-investimento-em-startups-e7cd6313e665
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